Não quero analisar a sistema educacional brasileiro, nem falar sobre a estupidez ou burocracia dos atos de certas pessoas que coordenam a educação de tantos de nós. Esses assuntos já são mais que debatidos nos corredores de nossas instituições públicas a cada atraso de professor, após testes ou avaliações incoerentes com a proposta de formação profissional, durante um estágio pouco produtivo e mal remunerado por empresas desorganizadas. Todos já tem opinião formada sobre isso, pergunte a qualquer formando.
Em menos de um mês serei um engenheiro. Pela lei, estarei autorizado a emitir laudos técnicos e poderei ser responsabilizado por erros nos seus conteúdos. Muito provavelmente serei pago um valor abaixo do piso salarial estabelecido por essa mesma lei pelo meu trabalho. Também será bem provável que nunca utilizarei mais de dez por cento de tudo aquilo que me foi passado nesses últimos anos e que, para exercer minha profissão, terei que passar por um treinamento adicional realizado pelo meu empregador.
Depois de tanto tempo de formação, esforço, renuncia de diversas outras coisas, eu me pergunto: foi para isso?
Quando estava saindo da UFC hoje, passei pela sala do Aeromec atual. Conversando um pouco com os atuais integrantes eu percebi que pouco havia mudado em relação a cinco anos atras. Os integrantes eram outros, mas a mentalidade do jovem recém-ingresso na engenharia é a mesma daqueles de 2005. Entreguei o que espero ser o último de muitos pedaços de burocracia necessário para validar meus estudos. Materializada numa folha de A4, algumas linhas de HP deskjet arial e uma assinatura em BIC estava uma gota do oceano de ineficiência daquela instituição.
De cara pensei, “mais um que desiste no primeiro ano” e até me senti bem por estar conseguindo sair pela porta da frente do curso. Mas como havia dito, nessas horas, ficomais pensativo e logo analisei a minha turma, os sessenta ingressantes de 2005. Tentei contar os que já estão formados, aqueles que, assim como eu, receberão o diploma em 2010.2 e aqueles que devem estar formados no ano que vem. Minha turma teve mesmo que ser dilacerada? Formar-se na engenharia é algo complicado, nesse semestre, seremos por volta de 15 ou 20, menos da metade dos que entram por ano. Tudo isso num país que deixa de crescer mais por falta de mão de obra especializada, que forma um quarto dos engenheiros que necessitaria. O problema é da universidade que é muito rígida ou dos alunos que são despreparados?
Ainda achávamos que seria mais fácil
O estudante secundarista brasileiro não é ensinado a enxergar essas oportunidades. Os ratos de cursinhos, dopados com as doses de informação mastigada das instituições particulares não conseguem enxergar além do horizonte de suas referências, pais, irmãos ou amigos mais velhos que conseguiram conforto, status e estabilidade. Dessa forma, multiplicam-se bacharéis de togas financiadas em cinco anos, otoscópios que valem pequenas fortunas expostos como colares de brilhantes ou qualquer jaleco branco confundido com prêmio de consolação, além de verbetes como APROVAÇÃO em caixa alta nos outdoors da zona leste de Fortaleza e o que hoje é conhecido como concursista.Se a indústria carece tanto de engenheiros, por que nos pagam tão mal? Se estudamos tanto, por que deixar que Maurícios e Patrícias “paguei-passei” ponham seus narizes acima dos nossos? Se temos tantas oportunidades, por que nos contentarmos com tão pouco? Se o Brasil precisa tanto de nós para crescer, por que nos entregarmos à mediocridade de sermos mais um? Se sonhamos tanto no início, por que não colocamos nossos planos, “agora modelados em 3D e ensaiados por elementos finitos”, em prática?
[Update] – Revirando as recomendações de meus amigos durante uma das incontáveis horas de ócio, achei esse artigo do Le Monde. Para quem não domina a língua de Molière, recomendo o google translator. Vale a pena.
http://www.lemonde.fr/idees/article/2010/10/29/les-ingenieurs-le-necessaire-retour_1432694_3232.html
 
 
